Estimulação Cerebral Profunda Para Tratamento da Distonia Primária Generalizada e Distonia Cervical
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Informações
A distonia é um distúrbio neurológico caracterizado por contrações musculares involuntárias, de forma sustentada ou intermitente, responsáveis por posturas e movimentos anormais. Sua fisiopatologia ainda não é totalmente compreendida, mas considera-se que alterações nos processos de inibição neuronal e plasticidade sensório motora, contribuam para a consumação do distúrbio motor.
A expressão clínica da distonia é determinada pela gravidade e distribuição dos músculos envolvidos, desde variações focais e segmentares mais leves promovidas por ações específicas, a casos mais graves, nos quais a progressão se manifesta de maneira generalizada, persistente e com deformidades fixas.
Essa condição acomete a musculatura das regiões craniana, dorsal, cervical, laríngea, membros superiores e inferiores, tornando-se muitas vezes incapacitante e afetando significativamente o quadro clínico do paciente. Além disso, pode estar associada a outros distúrbios do movimento e manifestações neurológicas, que contribuem não apenas na intensificação das limitações funcionais, mas também na estigmatização social e psicológica.
Existem diversos fatores responsáveis pelo desenvolvimento do distúrbio motor. Os termos “primária” e “secundária” são amplamente utilizados para fazer referência à etiologia da distonia. Quando se apresenta de forma primária, a distonia é o único sinal clínico, tem origem em distúrbios idiopáticos ou genéticos e não há anormalidades neuropatológicas. Na distonia secundária, estão presentes causas adquiridas (ex: lesões cerebrais) ou condições genéticas de curso progressivo associadas à neurodegeneração.
Por ser uma condição rara, dados nacionais e globais referentes a incidência e prevalência da distonia são escassos e normalmente divergentes, principalmente devido às diferenças metodológicas inerentes entre os estudos epidemiológicos. Segundo o Ministério da Saúde, existem cerca de 65 mil casos diagnosticados no Brasil e a incidência mundial chega a sete mil casos para cada milhão de habitantes.6 De acordo com uma revisão sistemática com meta-análise de 2012, estima-se que a prevalência da distonia primária na população seja de 16,43 casos a cada 100.000 pessoas no mundo (IC 95%: 12,09–22,32). [1]
O Relatório de Recomendação da Estimulação Cerebral Profunda Para o Tratamento da Distonia Primária Generalizada e Distonia Cervical
A PORTARIA SSCTIE/MS nº 108/2022 - Publicada em 07/10/2022 [2] aprovou o Relatório de recomendação da Estimulação cerebral profunda para o tratamento da distonia primária generalizada e distonia cervical.
Esta PORTARIA SCTIE/MS Nº 108, DE 5 DE OUTURBRO DE 2022 torna pública a decisão de ampliar o uso, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, da estimulação cerebral profunda para o tratamento de distonias, conforme protocolo estabelecido pelo Ministério da Saúde.
Descrição do Procedimento
A Deep Brain Stimulation (DBS), traduzida para o português como Estimulação Cerebral Profunda, é um procedimento cirúrgico utilizado no tratamento de diversas doenças neurológicas. Esta técnica foi utilizada pela primeira vez em 1986 como tratamento de tremores na doença de Parkinson, e sua utilização vem sendo expandida para o tratamento de distúrbios psiquiátricos e outros distúrbios motores, como a distonia
Seus princípios fisiológicos básicos correspondem na promoção de efeitos elétricos e neuroquímicos em todas as redes de estimulação, modulação da atividade oscilatória, plasticidade sináptica e em mecanismos de neuroproteção e neurogênese, que variam de importância dependendo da condição em tratamento e do alvo estimulado. Essas modulações são realizadas por um sistema de eletrodos estereotaticamente implantados nos núcleos da base, como o globo pálido interno (GPi), núcleo subtalâmico (NST) e tálamo. Os eletrodos são conectados via subcutânea por um fio a um gerador de impulsos elétricos, normalmente localizado na parte superior do peito.
Os parâmetros de estimulação elétrica como frequência, amplitude, intensidade e voltagem variam de acordo com o paciente, patologias, manifestações clínicas, alvos, entre outros fatores. São regulados por um controle remoto que se comunica com o dispositivo gerador de impulsos elétricos, garantindo um tratamento customizado para cada paciente.
A utilização dessa tecnologia é recomendada para pacientes com distonia refratária a terapia convencional ou que possuem estágios avançados e limitantes, mas normalmente é contraindicada em casos onde a distonia pode estar associada a demência, distúrbios psiquiátricos descontrolados e comorbidades com alto risco de evolução. Uma vez que o sucesso da terapia depende da integridade dos núcleos basais e de outras estruturas cerebrais, distonias de caráter lesional, como algumas distonias secundárias tendem a obter resultados menos satisfatórios, sendo necessária uma avaliação de risco-benefício mais cautelosa nesses pacientes.
A implantação de um sistema de estimulação cerebral profunda envolve alguns riscos comumente associados ao próprio procedimento cirúrgico, a problemas nos dispositivos e desencadeados pela estimulação. Portanto, podem ocorrer problemas de hemorragia, infecções, alergias, falha disfagia, intensificação de sintomas extrapiramidais, entre outros15. Nesse sentido, é de suma importância que este procedimento seja realizado em ambientes hospitalares esterilizados e com equipe multidisciplinar qualificada, a fim de diminuir danos possivelmente evitáveis.
Descrição Técnica da Tecnologia
Tipo: Produtos para a saúde
Tecnologia: Dispositivos de estimulação cerebral profunda
Indicação aprovada na Anvisa:
● Vercise: Doença de Parkinson responsiva à levodopa que não é controladaadequadamente com medicamento; distonia primária e secundária intratável, em pessoas com idade de 7 anos ou mais velhas; supressão do tremor não controlado adequadamente pelos medicamentos em pacientes diagnosticados com tremor essencial ou doença de Parkinson;
● Sceneray - gerador de pulso implantável recarregável: indicado como terapia adjuvante na redução de alguns sintomas da doença de Parkinson avançada e sensível a levodopa, que não são adequadamente controladas com medicamento;
● Sceneray - sistema de eletrodos e extensões para estimulação cerebral profunda 4 canais: indicado como terapia para pacientes com doença de Parkinson primária, média e avançada, que não são adequadamente controladas com medicação, e onde os sintomas das discinesias constitua uma significativa incapacidade funcional;
● Infinity 5 e Infinity 7 - O sistema de estimulação cerebral profunda da Abbott Medicalxé indicado para estimulação unilateral ou bilateral do globo pálido interno (GPi) ou do núcleo subtalâmico (STN) para o controle de distonia crônica intratável, incluindo distonia primária e secundária em pacientes com, pelo menos, 7 anos de idade.
Indicação proposta: Tratamento de distonia primária generalizada e distonia cervical nas populações adulta e pediátrica refratárias ao tratamento convencional
Contraindicações: Distonias associadas a demência, distúrbios psiquiátricos descontrolados e comorbidades com alto risco de evolução.
Cuidados e precauções: Pacientes que usam um neuroestimulador recarregável devem verificar se há irritação ou vermelhidão na pele próximo ao neuroestimulador durante ou após a recarga e entrar em contato com seu médico se os sintomas persistirem. Os pacientes devem evitar atividades que possam prejudicar o funcionamento do sistema de neuroestimulação, podendo resultar em perda de estimulação, estimulação intermitente, rompimento ou cirurgia adicional para substituir ou reposicionar o sistema de neuroestimulação. Os pacientes não devem mergulhar abaixo de 10 metros (33 pés) de água ou entrar em câmaras hiperbáricas acima de 2,0 atmosferas absolutas (ATA), pois isso pode danificar o sistema de neuroestimulação, antes de mergulhar ou usar uma câmara hiperbárica, os pacientes devem discutir os efeitos da alta pressão com seu médico.
Eventos adversos: Podem estar associados ao próprio procedimento cirúrgico, a problemas nos dispositivos e desencadeados pela estimulação. Os eventos adversos mais comuns identificados são infecção,disartria, migração de eletrodos, quebra dos fios conectores, feridas, disfagia, piora da distonia, depressão, bradicinesia, parestesias, hematomas, fadiga, hemorragia, ansiedade, alterações de humor, dor, epilepsia, falha nos dispositivos, alterações no padrão de sono, micrografia e psicose.
Deliberação Final
Plenário da Conitec, em sua 112ª Reunião Ordinária, realizada no dia 31 de agosto de 2022, deliberou por unanimidade recomendar a ampliação de uso da estimulação cerebral profunda para o tratamento da distonia primária generalizada e distonia cervical em pacientes refratários a terapia convencional. Os membros da Conitec consideraram os benefícios proporcionados pelo procedimento e a necessidade de uso para aqueles pacientes refratários aos demais tratamentos. A consulta pública não trouxe elementos para mudança da recomendação preliminar. Por fim, foi assinado o Registro de Deliberação nº 767/2022.
Padronização do SUS
Conforme a tabela do Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS (SIGTAP/SUS), constam os seguintes códigos disponíveis para a tecnologia:
04.03.08.001-0 - IMPLANTE DE ELETRODO PARA ESTIMULAÇÃO CEREBRAL
04.03.08.002-9 - IMPLANTE DE GERADOR DE PULSOS P/ARA ESTIMULAÇÃO CEREBRAL (INCLUI CONECTOR)
04.03.08.010-0 - TROCA DE GERADOR DE PULSOS PARA ESTIMULAÇÃO CEREBRAL
07.02.01.010-3 - CONJUNTO DE ELETRODO E EXTENSAO P/ ESTIMULACAO CEREBRAL
07.02.01.015-4 - GERADOR P/ ESTIMULACAO CEREBRAL
A ampliação de uso do procedimento para distonias normatiza uma situação que ocorre rotineiramente nos serviços, uma vez que o procedimento já está disponível para pacientes com distúrbios motores inespecíficos e também para o tratamento de Parkinson.