Detecção pré-natal de infecção pelo vírus T-linfotrópico humano (HTLV) 1/2 em gestantes
Índice
Introdução
Os vírus T-linfotrópicos humanos (HTLV)-1 e HTLV-2 foram os primeiros retrovírus humanos oncogênicos identificados no início dos anos 80, sendo considerados atualmente os vírus mais oncogênicos já identificados.
Estes vírus atacam principalmente as células do sistema imunológico, que são responsáveis pela defesa do organismo. Eles têm um forte tropismo por linfócitos T e são transmitidos principalmente por infecção célula-célula. Uma vez adquirida, a infecção pelo HTLV permanece por toda a vida e, embora a maioria das pessoas com a infecção não manifeste sintomas, elas podem transmitir o vírus. A transmissão ocorre por meio de relação sexual desprotegida, do contato com sangue ou tecidos infectados e da mãe para o bebê, durante a gestação, parto ou amamentação.
Existem quatro tipos de HTLV, sendo mais comuns o HTLV 1 e o HTLV 2.
A infecção por HTLV-1 está associada a uma variedade de doenças, neoplásicas como a leucemia de células T do adulto (ATL), doenças inflamatórias não neoplásicas, como mielopatia associada ao HTLV-1 (HAM) / Paraparesia espástica tropical (TSP) e uveíte pelo HTLV-1 (HU), bem como outras doenças com associações não tão bem estabelecidas como artropatia, pneumopatia, dermatite, exocrinopatia e miosite.
A ATL é definida como crescimento clonal neoplásico de células T infectadas por HTLV-1, altamente agressiva, e é caracterizada por características clínicas únicas, incluindo hipercalcemia e infiltração grave de células leucêmicas em órgãos.
A HAM e a HU caracterizam-se por infiltração de linfócitos infectados pelo HTLV-1 e produção desregulada de citocinas. [1]
Tratamento
Em relação às duas complicações mais frequentes e graves do HTLV-1/2:
A) A ATL Associada ao Vírus HTLV-1 é tratada com Zidovudina (AZT) e interferon, tendo um Protocolo Clínico e Diretriz Terapêutica específico, publicado na forma de portaria em 18 de julho de 1016.
A rigor existem 4 subtipos de ATL: agudo, crônico, latente e forma linfomatosa (caracterizada por linfadenopatia proeminente sem envolvimento sanguíneo). Pacientes com as 3 primeiras formas pareceram se beneficiar da terapia antiviral de primeira linha, enquanto pacientes com ATL do tipo linfoma/linfomatosa não. Nestes casos e naqueles que apresentam progressão o tratamento envolve diferentes regimes quimioterápicos e às vezes transplante de células hematopoiéticas.
B) O manejo da HAM, por sua vez, é principalmente sintomático (fisioterapia, uso de medicamentos para dor e para espasmos musculares), pois as opções de tratamento modificadoras da doença são limitadas. Um painel multidisciplinar de especialistas da Associação Internacional de Retrovirologia indica o uso de corticosteroides sistêmicos em pacientes com doença progressiva (alta dose de prednisolona na forma de pulso para indução; baixa dose (5 mg) de prednisolona oral para terapia de manutenção). Não há, no entanto, consenso e não há ensaios clínicos randomizados. Em termos prognósticos, em estudo de Olindo et al. com 123 pacientes acompanhados ao longo de 14 anos, os autores observaram um intervalo médio de 21 anos entre o início dos sintomas e a necessidade de uso permanente de cadeira de rodas.
Em 2021 o Ministério da Saúde publicou o ‘Guia de Manejo Clínico da Infecção pelo HTLV’, que traz recomendações sobre diagnóstico, tratamento e acompanhamento do HTLV e suas principais manifestações clínicas
DETECÇÃO PRÉ-NATAL de infecção pelo vírus T-linfotrópico humano (HTLV) 1/2
Estima-se que existem, no mundo, entre 15 e 20 milhões de pessoas afetadas pelo HTLV 1/2 (HTLV dos tipos 1 e 2). A quantidade de pessoas infectadas aumenta com a idade, especialmente entre mulheres.
Identificar a infecção em grávidas, antes do parto, é uma estratégia para prevenir a transmissão da mãe para o bebê.
Segundo o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis (PCDT-IST), a amamentação é a principal forma de transmissão do HTLV para bebês. Costuma ocorrer com 20% a 30% das crianças amamentadas por mães com infecção pelo vírus.
Como a infecção pelo vírus T-linfotrópico humano (HTLV) é detectada no SUS
O diagnóstico da infecção pelo HTLV 1/2 envolve detecção sorológica da presença dos vírus e baseia-se na detecção de anticorpos específicos contra o vírus, os quais estão presentes em fluidos biológicos. Os métodos sorológicos podem ser classificados em triagem e confirmação.
Os ensaios de triagem rotineiros detectam anticorpos contra o HTLV1 e o HTLV-2, porém, não apresentam capacidade discriminatória entre essas duas infecções. O mais comumente utilizado no Brasil nos laboratórios públicos é o ELISA ou EIM, um ensaio imunoenzimático. Para triagem, alguns laboratórios utilizam os ensaios de quimioluminescência (CLIA).
A confirmação do resultado da triagem deve ser feita por ensaios de alta especificidade, capazes de distinguir a infecção causada pelo HTLV-1 daquela causada pelo HTLV-2. Existem duas formas principais de fazer o diagnóstico confirmatório: testes sorológicos e testes moleculares. Entre os métodos sorológicos, o mais utilizado é o Western blot ou Western blotting (WB), e os testes moleculares (que se baseiam na detecção do ácido nucléico viral, na forma de DNA proviral) são conhecidos como PCR.
Na tabela SIGTAP, os testes para detecção do vírus HTLV estão padronizados com os seguintes códigos:
02.02.03.031-8 - PESQUISA DE ANTICORPOS ANTI-HTLV-1 + HTLV-2: CONSISTE EM UM TESTE IMUNOENZIMÁTICO, PARA DETECTAR A PRESENÇA DE ANTICORPOS ANTI-HTLV NO SORO OU PLASMA.
02.02.03.125-0 - DETECÇÃO DE DNA PROVIRAL DO HTLV-1 E DO HTLV-2: ENSAIOS MOLECULARES DO TIPO PCR EM TEMPO REAL, PARA A DETECÇÃO DE DNA PROVIRAL DE HTLV-1 OU HTLV-2.
02.02.03.126-8 - TESTE CONFIRMATÓRIO COM PESQUISA DE ANTICORPOS ANTI-HTLV-1 + HTLV-2: IMUNOENSAIOS EM LINHA (LIA.LINE IMMUNOASSAY) OU DO TIPO WESTERN BLOT PARA DETECÇÃO DE ANTICORPOS ANTI HTLV-1 + HTLV-2 PARA CONFIRMAÇÃO DE SOROPOSITIVIDADE EM CASO JÁ DIAGNOSTICADO COMO LEUCEMIA/LINFOMA DE CÉLULAS T DO ADULTO (ATL).
Tecnologia analisada: testes do tipo Elisa, Western Blot e PCR
A ampliação de uso desses testes, no SUS, para diagnosticar a infecção pelo HTLV 1 e 2 em gestantes no pré-natal foi demandada pela Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, do Ministério da Saúde (SVSA/MS).
Para avaliar a eficácia, segurança, custo-efetividade e impacto orçamentário da ampliação, foi feita uma análise de evidências clínicas e econômicas.
As evidências indicaram que a utilização dos testes de triagem e confirmação no pré-natal pode reduzir os riscos de transmissão da infecção pelo HTLV da mãe para o bebê, inclusive por possibilitar orientar as mães para não amamentarem, no caso de daquelas cujos testes acusem a presença do vírus.
Recomendação da CONITEC
Os membros do Comitê de Produtos e Procedimentos da Conitec, em sua 126ª Reunião Ordinária, realizada no dia 02 de fevereiro de 2024, deliberaram por unanimidade, recomendar a incorporação do exame para detecção pré-natal de infecção pelo vírus T-linfotrópico humano (HTLV) 1/2 em gestantes. Após os esclarecimentos feitos pelo demandante e pelo especialista, e da apresentação das contribuições de consulta pública, o Comitê entendeu que existe uma necessidade médica não atendida e que a detecção pré-natal para HTLV 1/2 em gestante no SUS apresenta benefícios clínicos claros à população de interesse. Foi assinado o Registro de Deliberação nº 877/2024.
Portaria
A PORTARIA SECTICS/MS Nº 13, DE 3 DE ABRIL DE 2024 torna pública a decisão de incorporar, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, o exame para detecção pré-natal de infecção pelo vírus T-linfotrópico humano (HTLV) 1/2 em gestantes. [2]