Internação Psiquiátrica Compulsória

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Índice

CONCEITOS BÁSICOS E A LEI 10.216

Em 06/04/2001 foi promulgada a Lei 10.216, visando a "proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental" A Lei 10216 [1], definiu as modalidades de internação psiquiátrica:


"I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;

II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e

III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça."


Estas definições constam no parágrafo único do Art. 6º que, antes de mais nada, define que "A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos." Laudo circunstanciado não é atestado singelo: é documento detalhado, descrevendo o estado clínico, os tratamentos já tentados, as falhas e as expectativas de terapias no hospital, e explicitando as razões médicas da indicação. Os motivos, em um laudo médico, são motivos clínicos, de ordem psicopatológica e terapêutica, não sociais ou referentes aos desejos dos familiares.
Dessa forma, uma ordem judicial determinando internação hospitalar psiquiátrica, obrigatoriamente, precisa se embasar em um laudo médico circunstanciado, detalhado, explicitando os motivos que levam o médico a prescrever a internação e fazendo a indicação clínica da mesma. Verifica-se que o objetivo primordial da lei 10216 era, sobretudo coibir qualquer forma de asilamento ou detenção arbitrária de pacientes sob o argumento de "internação psiquiátrica", independentemente se a internação foi motivada pela autoridade médica, autoridade judicial, ou conluio entre família e autoridade. A lei também visa coibir supostas "internações psiquiátricas" em instituições que não se prestam para tal, tais como instituições do serviço social ou aquelas voltadas reabilitação psicossocial de dependentes químicos (comunidades terapêuticas). Vejamos que a mesma Lei, no seu artigo 8o., colocou o Ministério Público como órgão fiscalizador das internações compulsórias.


Art. 8o A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado onde se localize o estabelecimento. § 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta.


As prerrogativa da Lei foram reafirmadas na "Carta de Florianópolis", lavrada pelos integrantes do grupo de trabalho da 1ª Conferência Nacional Saúde Mental e Direito: construindo interfaces, concretizando direitos, reunidos nos dias 02 e 03 de agosto de 2013 na sede da Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC), em Florianópolis, após debates e deliberações nas oficinas temáticas e que foi subscrita pelas Associações Brasileira e Catarinense de Psiquiatria, além da AMC, da Escola Superior da Magistratura e do Conselho Regional de Psicologia - Regional 1. Os trabalhos àquela época resultaram ainda que, em 27/06/2014, a Corregedoria Geral da Justiça elaborou o Ofício Circular 109/2014 aos magistrados do estado, fazendo-os cientes que a alta hospitalar é ato privativo da atuação médica.


O QUE NÃO É INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA COMPULSÓRIA?

Deve-se ficar claro que internação psiquiátrica diz respeito a internação em instituição hospitalar. Assim, não há embasamento para decisões de internação compulsória em outro tipo de instituição tais como residência inclusivas do serviço social ou comunidades terapêuticas acolhedoras, estas últimas que são instituições muito comuns no Brasil, voltadas a reabilitação de dependentes químicos (vide mais abaixo).

Neste sentido, em 05 de junho de 2019 foi sancionada a Lei nº 13.840 [2], que alterou a Lei 11.343/2006 [3] (Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad), definindo as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas, além de tratar do financiamento das políticas sobre drogas e dar outras providências. Asim, em Art. 23, traz que:

"Art. 23-A. O tratamento do usuário ou dependente de drogas deverá ser ordenado em uma rede de atenção à saúde, com prioridade para as modalidades de tratamento ambulatorial, incluindo excepcionalmente formas de internação em unidades de saúde e hospitais gerais nos termos de normas dispostas pela União e articuladas com os serviços de assistência social (...) § 9º É vedada a realização de qualquer modalidade de internação nas comunidades terapêuticas acolhedoras."

Serviços de cuidados intermediários, tais como residenciais terapêuticos, também não são instituições hospitalares, e não podem realizar qualquer tipo internação compulsória. (Para detalhes, ver em: [[1]])

Muitos serviços privados que se chamam popularmente de "clínicas", na verdade são comunidades terapêuticas ou instituições assemelhadas ao residenciais inclusivos da Assistência Social. Muito comumente a família que quer encerrar um paciente numa destas instituições recorre ao judiciário com o argumento de "internação compulsória". Vejamos que, primeiramente, a instituição apta para tal deve ter uma estrutura hierárquica conforme normas do Conselho Federal de Medicina (direção técnica e direção clínica). Ademais, a internação compulsória só pode ser realizada onde há médico responsável devidamente registrado ao Conselho Regional de Medicina, e deve realizar a comunicação ao Ministério Público em até 72hs.

PRINCÍPIOS DO TRATAMENTO AMBULATORIAL

No Sistema Único de Saúde a porta de entrada para o tratamento de qualquer transtorno mental é o regime ambulatorial. O paciente poderá ser encaminhado para internação hospitalar mediante indicação do médico assistente, geralmente no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), uma vez que são estas estruturas no SUS responsáveis pelo atendimento dos transtornos mentais de maior gravidade. Conforme a Lei 10.216, a internação deve ser embasada em indicações clínicas e quando todas as possibilidades extra-hospitalares estiverem esgotadas. Neste sentido, cabe ressaltar que os serviços comunitários são bastante importantes após a alta hospitalar, visando prevenir o fenômeno da "porta giratória" (reinternações frequentes). Cumpre salientar que os serviços comunitários são responsáveis pelo planejamento terapêutico do paciente de longo prazo. Assim, num espírito contrário ao da "conservação da ordem social” prevista no Decreto-Lei nº 891/1938, a Lei 10.216, de 6 de abril de 2001 redireciona o modelo assistencial em saúde mental, para fora dos hospitais em direção à comunidade, aos ambulatórios, aos centros de atenção psicossocial e a outros dispositivos a serem criados a partir da instalação do Sistema Único de Saúde nos municípios brasileiros. Tal mudança é natural diante do avanço no tratamento dos transtornos mentais, especialmente após a incorporação de um grande arsenal de antipsicóticos, capaz de controlar as doenças mentais maiores, tais como a esquizofrenia e a doença maníaco-depressiva (transtorno bipolar tipo I). A estruturação dos CAPS é de responsabilidade dos municípios. Municípios menores, onde a população não é suficiente para estruturação do CAPS, podem associar-se a municípios vizinhos em consórcio para criar CAPS “microrregional”. Na mesma ordem, em relação ao atendimento de dependente químico, consta à sessão IV, da Lei Nº 13.840, que o tratamento do usuário ou dependente de drogas deverá ser ordenado em uma rede de atenção à saúde, com prioridade para as modalidades de tratamento ambulatorial.


TÓPICOS SOBRE A INTERNAÇÃO HOSPITALAR

A lei 10.216/01 atrela a assistência e a promoção de ações de saúde à devida participação da sociedade e da família. Restringe as indicações de internação para casos em que o tratamento ambulatorial se mostrar falho ou impossível de ser realizado, conforme reza o art. 4o.: "Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes."

Contra o desejo de muitas famílias, de encerrarem para sempre seu familiar em um asilo estatal, a Lei proíbe colocar doentes mentais em instituições asilares. Assim, no mesmo artigo 4o. da Lei, no seu § 1o, contraria as noções populares comuns de que hospital psiquiátrico é campo de concentração para indesejados, abrigo permanente para rejeitados, pensionato para quem não tem casa ou asilo para quem é expulso do convívio familiar, e no § 3o veda a internação asilar: "§ 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio." § 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares."

O tempo de permanência no hospital dependerá da evolução do quadro clínico do paciente. Sua alta deverá ser dada por critérios técnicos, a cargo do médico que o atende.[4] Assim, a determinação para internação por tempo pré-estabelecido não se baseia em evidências científicas constantes na literatura médica de qualidade. A alta hospitalar é ato privativo ao médico que assiste o paciente, não cabendo tampouco a definição prévia pelo médico assistente do regime ambulatorial. Tampouco a decisão judicial acerca uma internação compulsória pode adentrar na seara médica e determinar o dia da alta.

A atenção à saúde mental é atualmente organizada no SUS dentro da área temática da "RAPS" - Rede de Atenção Psicossocial. Em Santa Catarina, está publicada no [portal eletrônico da Secretaria de Estado da Saúde https://www.saude.sc.gov.br/index.php/resultado-busca/redes-de-atencao-a-saude-profissionais/10243-rede-de-atencao-psicossocial-raps]</ref>.

Os principais hospitais com leitos SUS e aptos a receber pacientes psiquiátricos em Santa Catarina são:


MunicípioHospitalNº leitos
BlumenauHosp. Santo Antônio10
BrusqueHosp. Arquiodes Consul C. Renaux4
ConcórdiaHosp. São Francisco 17
CuritibanosHosp. Helio dos Anjos Ortiz20
JoinvilleHosp. Matern. Infantil Dr. Jesser A. Faria14
JoinvilleHosp. Regional Hans Dieter Schmidt30
Jaraguá do SulHosp. e Matern. Jaraguá4
LagunaHosp. Senhor Bom Jesus dos Passos15
Lauro Muller Hosp. Munic. Henrique Lage15
Lindóia do SulHosp. Izolde Hubner Dalmora8
LuzernaHosp. São Roque30
MondaiAssoc. Hospital Mondaí15
PalmitosHosp. Regional de Palmitos25
PapanduvaHosp. Maternidade São Sebastião2
Ponte SerradaHosp. Santa Luzia 13
Praia GrandeHosp. N. Senhora de Fátima8
QuilomboHosp. São Bernardo12
Santa CecíliaHosp. e Maternidade Sta Cecília30
São JoséIPQ/SC160
Rio do SulHosp. e Maternidade Samária30
TimbóHosp. Oase4
Três BarrasHosp. Félix da Costa Gomes8
TunápolisAssoc. Hospitalar de Tunápolis13
Urussanga Hosp. N. Senhora da Conceição30


O Instituto de Psiquiatria de Santa Catarina (IPQ/SC), é um estabelecimento público, que serve como referência estadual para casos clínicos psiquiátricos complexos, inclusive tratamento de dependência química. Muito embora atualmente há alguns CAPS tipo III que contam com serviços 24hs, o IPQ/SC dispõe da única emergência psiquiátrica funcionando 24 horas ao dia em hospital psiquiátrico. Assim, qualquer paciente que necessite de internação psiquiátrica da região da capital pode se desolcar ao setor de Triagem e Atendimento de emergência para que seja avaliado e tenha sua indicação médica para internação confirmada.


TÓPICOS ACERCA DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA E TRATAMENTOS DE REABILITAÇÃO

A dependência química é uma síndrome médica que tem acompanhado a humanidade desde eras mais remotas, e ocorre em todas as faixas etárias. Desde a antiguidade o ser humano descobriu drogas capazes de alterar seu humor e percepção, as quais com potencial variável de ocasionar compulsão ao uso, determinante para o estabelecimento da dependência química. Uma vez estabelecida a dependência química, o indivíduo passa a buscar a substância não apenas visando o prazer, mas também para dirimir os efeitos da síndrome de abstinência. Tais comportamentos e eventos - de busca da substância, intoxicação, recuperação, síndrome de abstinência - consomem grande parte do tempo do indivíduo, que, nas fases mais graves passam o dia inteiro em função da droga.

O fato de alguém ser usuário de substâncias químicas, sejam elas a nicotina, a cafeína, o álcool etílico ou as ilegais, não é fenômeno que obrigatoriamente demande assistência médica ou cuidados em saúde. As drogas ilícitas, não são, no entanto, ilícitas por coincidência, pois é muito raro, senão impossível, o indivíduo conseguir fazer uso controlado de tais substâncias, havendo potencial muito alto de desenvolver abuso, dependência química ou mesmo síndromes psicóticas. Ou seja, as drogas de abuso têm potencial de deflagrar doenças diversas, não somente a síndrome de abstinência, mas também psicoses agudas e crônicas, distúrbios cognitivos, e outras doenças médicas gerais, tais como eventos vasculares muito comuns no uso de cocaína (AVC e infarto do miocárdio). Aqui cabe comentar sobre o álcool, droga lícita que também tem potencial devastador, com uma das síndromes de abstinência mais graves ("delirium tremens"), além de degradação do tecido nervoso, que ocorre na síndrome de Korsakov e demências.

No SUS, o tratamento da dependência química deve ser direcionado aos Centros de Atenção Psicossociais (CAPS). Em municípios maiores, convém a estruturação de CAPS-ad, isto é, especializado no tratamento de pessoas com problemas com álcool e outras drogas. Conforme informações disponíveis no Portal Brasil, "O SUS tem os Centros de Atenção Psicossocial para álcool e drogas (CAPSad), de atendimento diário, com atividades laborais, de lazer e de cidadania." Ainda, "A internação em hospital psiquiátrico não é a principal forma de tratamento." Uma das conclusões da "Carta de Florianópolis" é que não basta apenas a internação, mas a continuidade do tratamento ambulatorial após a alta também deve ser foco do judiciário.

Neste sentido, é muito importante abordar a importância do tratamento ambulatorial. Muito importante, para avançar da fase priomordial do tratamento em dependência química é o envolvimento dos "codependentes", em geral familiares. A codependência é um fenômeno não exclusivo da dependência química, mas é aqui que mais se observam tais influências. Trata-se de perturbações emocionais nos indivíduos que não são os reconhecidos diretamente com a doença (no caso, a drogadição), mas que com ele se relaciona de forma complexa, que, além de não conseguir se desvincular ou mesmo estabelecer um relacionamento saudável, atua de forma a propagar o comportamento de drogadição. Ou seja, os codependentes são "dependentes" junto com o adicto, só que afetivamente e não das substâncias em si, pois há uma relação afetiva patológica, na qual um utiliza a fragilidade do outro como justificativas para permanecer no ciclo de dependência química e cuidados. Por isso, é tão importante a abordagem integral da dependência química, onde se pode atuar sobre o comportamento patológico também do codependente, fornecendo recursos para que se reconheça e interrompa o padrão de satisfação que ocorre quando se coloca o "salvador" do adicto, que por fim leva a manutenção do ciclo vicioso e o codependente também deixa de viver sua própria vida e sonhos em função do outro.

Também mantido pelo Governo Federal, o sítio Crack, é possível vencer traz todas as informações desenvolvidas no Brasil no intuito do combate a dependência dessa droga.

Quando houver necessidade de internação de dependentes químicos, também deverá ser observada a Lei 10216. Tais normativas foram reforçadas na na Lei Nº 11.343/2006, que trata das políticas públicas sobre drogas:

"§ 2º A internação de dependentes de drogas somente será realizada em unidades de saúde ou hospitais gerais, dotados de equipes multidisciplinares e deverá ser obrigatoriamente autorizada por médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado onde se localize o estabelecimento no qual se dará a internação.

§ 3º São considerados 2 (dois) tipos de internação:

I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do dependente de drogas;

II - internação involuntária: aquela que se dá, sem o consentimento do dependente, a pedido de familiar ou do responsável legal ou, na absoluta falta deste, de servidor público da área de saúde, da assistência social ou dos órgãos públicos integrantes do Sisnad, com exceção de servidores da área de segurança pública, que constate a existência de motivos que justifiquem a medida."


Tratamentos complementares em Dependência química - Comunidades Terapêuticas


A Resolução n. 1980/11 do Conselho Federal de Medicina [5] definiu que estabelecimentos de saúde, também chamados de serviços de saúde ou unidades de saúde, são aqueles onde se exerçam atividades de diagnóstico e tratamento, visando a promoção, proteção e recuperação da saúde e que sejam de direção técnica de médicos.

Existem diversas instituições que agem na área da prevenção terciária não-médica, por autoajuda, de forma eletiva (opcional), criando condições para que pessoas mudem seu estilo de vida e deixem de conviver em ambientes que os induzam ao abuso de drogas. Também auxiliam na promoção de comportamentos mais adequados que auxiliam na prevenção de recaídas. Estas instituições não são hospitais e nem clínicas de saúde - mas sim instituição de permanência mais longa com características eminentemente psicossociais.

Em geral, foram denominadas "Comunidades Terapêuticas", dado seu caráter comunitários, isto é, convivência de indivíduos semelhantes (dependentes químicos), convivendo e auxiliando-se mutuamente para buscar a sobriedade e mudanças do estilo de vida.

As comunidades terapêuticas não estão, portanto, sob o crivo de unidades de saúde, mas há uma série de regulamentações sociais e sanitárias para o seu funcionamento. É necessário um responsável técnico, geralmente psicólogo, sendo de boa praxe a presença de médico, enfermeira e assistente social. O fato de ter equipes de saúde que atendam seus hóspedes não as transforma em hospital, em clínica ou em consultório. Da mesma que uma penitenciária, um aeroporto ou um supermercado que mantenha contrato com um médico para eventualmente atender seus funcionários, não os transformam, por isso, em hospitais, nem em clínicas, nem em consultórios.

A Lei Nº 13.840, também, discorre sobre o acolhimento do usuário ou dependente de drogas na comunidade terapêutica, como demonstrado abaixo.

Art. 26-A. O acolhimento do usuário ou dependente de drogas na comunidade terapêutica acolhedora caracteriza-se por:

I - oferta de projetos terapêuticos ao usuário ou dependente de drogas que visam à abstinência;

II - adesão e permanência voluntária, formalizadas por escrito, entendida como uma etapa transitória para a reinserção social e econômica do usuário ou dependente de drogas;

III - ambiente residencial, propício à formação de vínculos, com a convivência entre os pares, atividades práticas de valor educativo e a promoção do desenvolvimento pessoal, vocacionada para acolhimento ao usuário ou dependente de drogas em vulnerabilidade social;

IV - avaliação médica prévia;

V - elaboração de plano individual de atendimento na forma do art. 23-B desta Lei; e

VI - vedação de isolamento físico do usuário ou dependente de drogas.

§ 1º Não são elegíveis para o acolhimento as pessoas com comprometimentos biológicos e psicológicos de natureza grave que mereçam atenção médico-hospitalar contínua ou de emergência, caso em que deverão ser encaminhadas à rede de saúde.

Este último ponto, bastante importante e prático, coaduna com o fato de que comunidades terapêuticas não são alternativas para o devido atendimento médico hospitalar.

A mesma lei dispõe que a internação involuntária de dependentes químicos:

III - perdurará apenas pelo tempo necessário à desintoxicação, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, tendo seu término determinado pelo médico responsável;

Para maiores detalhes, vide: http://ceos.saude.sc.gov.br/index.php/Comunidades_terapêuticas

A MEDIDA DE SEGURANÇA

Os Hospitais de custódia, antes denominados "Manicômios Judiciários", não são administrados pelo Sistema Único de Saúde e apenas tangenciam a RAPS. Em todas as unidades federativas do país, os hospitais de custódia e tratamento não pertencem às Secretarias de Saúde, mas às Secretarias de Justiça ou de Segurança.

Em Santa Catarina, o HCTP (Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico) atualmente é vinculado à Secretaria de Administração Prisional. Tem por finalidade primordial a custódia dos apenados em medida de segurança, isto é, indivíduos de cometeram delitos em função de desordem mental. Secundariamente, se presta ao tratamento de apenados com distúrbios mentais.

Algumas vezes operadores do Direito confundem a internação para tratamento médico comum com a noção de medida de segurança criada durante o Estado Novo brasileiro (vide o Decreto-Lei 2.840, de 7 de dezembro de 1940, ou Código Penal). A medida de segurança, quando implica tratamento médico obrigatório, em sucedâneo de manicômio judiciário, é reservada apenas a situações derivadas de crimes praticados por doentes mentais inimputáveis processados.

A medida de segurança difere da atividade médica no SUS, este o qual não depende de aval ou de autorização judicial para ser exercida. A alta médica hospitalar não pode ser confundida com alvará de soltura para presidiários ou medida de segurança, pois o hospital não é uma prisão e o sistema de saúde não é parte do sistema prisional.

Para maiores detalhes, vide: [[2]]


QUESTÕES DE ORDEM PRÁTICA

A lei 10216 definiu a internação compulsória com objetivos de garantir o acesso a tratamento reabilitador a indivíduos com grave transtornos mentais, mas nos quais os serviços de saúde foram exauridos na sua capacidade de abordar o paciente. Exemplificando, seria aquele paciente com grave erro de julgamento, no qual a doença mental não permite a busca de um tratamento voluntariamente, mas que também a família e os serviços de saúde não conseguem realizar o tratamento involuntariamente.

Deve-se atentar que a requisição familiar de uma ordem judicial para internar em hospital psiquiátrico contém, muitas vezes, o desejo velado de asilar o paciente, no antigo modelo "manicomial", quando não haviam os recursos terapêuticos atuais. Ainda se observam casos em que familiares recusam-se a buscar o paciente de alta e levá-los para casa. Muitos destes casos chegam ao judiciário, ou seja, quando a família pleiteia a continuidade do ato segregante, sob as mais variadas desculpas, como “risco à vida” e como “direito constitucional à saúde”.

Após 20 anos da lei, discussões interdisciplinares e resoluções, na prática tem ocorrido que muitas varas judiciais com maior experiência no assunto têm atuado em tais pedidos deferindo especialmente a "avaliação compulsória". Ou seja, utiliza-se do aparato judicial para abordar o paciente e levá-lo para uma avaliação médica contra sua vontade, deixando a internação a critério do médico avaliador - pois, de fato, a internação requer um laudo médico circunstanciado caracterizando os motivos da internação.

Muitos pedidos de internação compulsória erroneamente o advogado da parte autora deixa de incluir o município no pólo passivo. Isto é bastante complicado para a operacionalização de uma decisão de internação compulsória, não somente porque cabe ao município o tratamento ambulatorial, mas especialmente porque é de responsabilidade do município o transporte do indivíduo por ambulância. Ora, os hospitais não têm qualquer condição de retirar as ambulâncias de sua função de atender os pacientes internos para sair a busca de pacientes em sua residência, sob o risco de atuação negligente com os primeiros e imprudente para com o segundo. São as ambulâncias do municípios, junto das equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF), que agrega agentes comunitários, junto de equipes especializadas de NASF e CAPS que podem buscar o paciente em sua residência para levá-lo então ao órgão hospitalar. Aí sim, muitos casos pode haver necessidade de apoio policial, de oficiais de justiça, garantindo o acesso a saúde do indivíduo que não tem condição de decisão.

Também há muitos pacientes que recebem alta médica em internações pelo SUS saem melhorados, ou seja, recuperados e sóbrios, livres de psicopatologia maior. Então por que voltam a internar? Pode-se dizer que há muitas respostas. Doentes mentais podem não ter acesso a tratamento ambulatorial - ou, mais grave e não raro, o tratamento ambulatorial pode ser boicotado pelos mais diversos motivos. Preconceitos religiosos pode fazer com que deixe de usar a medicação. Famílias desestruturadas também podem boicotar o tratamento do paciente usado como "bode expiatório". Grande parcela dos pacientes que são dependentes químicos decidem, livremente, retornar ao consumo de álcool, do abuso de remédios e de outras drogas ilícitas. Pode haver inclusive benefícios secundários para tal comportamento.

Em dependência química, inexiste qualquer método que garante que o indivíduo não ira retornar ao ao uso de drogas abusivas. Os dependentes químicos que saem de um internação recebem do médico a prescrição de uma simples dieta: abster-se das drogas e do álcool. Também na maior parte destes casos carece a adesão ao tratamento ambulatorial de forma integrada, abordando inclusive os co-dependentes. Não há justificativas para que, em municípios pequenos, se alegue que não existe CAPS-ad: todo município dispõe ao menos de atenção básica, apoio de psiquiatras e psicólogos, e os grupos de apoio tais como NAs e AAs estão disponíveis em todo território nacional.

Deve-se, portanto, ficar clara que que a decisão da abstinência deve ser pessoal - nada adianta o médico, a família ou o juiz querer que o indivíduo deixe de ser dependente químico, se ele não quiser. Muitas vezes a pressão destes atores contra o desejo do indivíduo, tem efeitos contrários: o dependente químico perde a confiança da família, e passa a ver os órgãos de saúde como inimigos e indesejáveis, e não como suportes auxiliadores na sua transformação.

A Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990 [6] define os limites do Estado na prestação de serviços e explicita a obrigação do cidadão, de cuidar de si, não dilapidando o que o Estado lhe pode proporcionar:

"Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade."

O SUS provê as condições, mantendo a rede básica de saúde e os CAPS, além de garantir vagas hospitalares, se for necessária a internação. O estado vem formulando e executando políticas adequadas à questão, inclusive atualmente regulando leitos em comunidades terapêuticas credenciadas para a fase terciária, a reabilitação psicossocial.

Por fim, há muitos pedidos de asilamento transvestidos de "internação compulsória", que o paciente acaba por ser admitido em uma instituição privada de características asilares. Há também pedidos de tratamento de dependentes químicos que a família espera encerrar o indivíduo em uma instituição por tempo indeterminado, totalmente contrário às normativas legais, e algumas vezes tais pacientes acabam por serem admitidos em instituição das mais diversas, tais como comunidades terapêuticas com práticas questionáveis de permanência involuntária ou supostas "clínicas" das mais diversas, mas que não possuem estrutura nem profissionais médicos. Esperamos que, estes casos, também estejam sob a fiscalização do Ministério Público.

Inexiste política pública que trate da transferência permanentes de cuidados de uma família para o Sistema Único de Saúde.


REFERÊNCIAS