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Quanto à incontinência urinária pós-prostatectomia, sabe-se que, na maioria dos casos, ela se resolve de maneira espontânea no período de seis a 12 meses após o procedimento. Inclusive, esse tempo de recuperação da continência pode ser diminuído com a adoção de técnicas de reabilitação já nos primeiros meses. A respeito disso, pode ser indicado o Treinamento dos Músculos do Assoalho Pélvico (TMAP), porém, essa técnica não oferece benefícios passados 12 meses da realização da prostatectomia.  https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/consultas/relatorios/2025/sociedade/relatorio-para-sociedade-no-573_esfincter-urinario_pos-prostatectomia.pdf
 
Quanto à incontinência urinária pós-prostatectomia, sabe-se que, na maioria dos casos, ela se resolve de maneira espontânea no período de seis a 12 meses após o procedimento. Inclusive, esse tempo de recuperação da continência pode ser diminuído com a adoção de técnicas de reabilitação já nos primeiros meses. A respeito disso, pode ser indicado o Treinamento dos Músculos do Assoalho Pélvico (TMAP), porém, essa técnica não oferece benefícios passados 12 meses da realização da prostatectomia.  https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/consultas/relatorios/2025/sociedade/relatorio-para-sociedade-no-573_esfincter-urinario_pos-prostatectomia.pdf
  
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O tratamento da IUE é realizado inicialmente com medidas conservadoras que incluem '''fisioterapia de reabilitação do assoalho pélvico''', medidas comportamentais que incluem treinamento vesical e orientações de ingesta hídrica. Não há tratamento farmacológico eficaz para IUE, restando como opção para aqueles pacientes sem resposta ao manejo inicial e persistente após um ano o tratamento cirúrgico. Dentre os tratamentos cirúrgicos estão incluídos '''slings masculinos e o implante de esfíncter urinário artificial'''.
  
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== O Esfíncter Urinário Artificial ==
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O esfíncter urinário artificial (EUA) é um dispositivo composto por um manguito uretral circunferencial, um reservatório de balão regulador de pressão e uma bomba escrotal. O manguito abre após compressão manual da bomba escrotal permitindo que o paciente urine a intervalos programados e fecha automaticamente após um período de dois a três minutos, o que confere a continência urinária. O paciente deve ter capacidade cognitiva e destreza suficientes para operar o dispositivo de forma correta.
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O implante de EUA é considerado pelas Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT) do Adenocarcinoma de Próstata, como padão ouro para incontinência urinária grave masculina persistente (após 12 meses) pós-prostatectomia radical. O EUA é implantado cirurgicamente, em centros especializados, e a experiência do cirurgião é um fator crítico de sucesso do procedimento. Antes da colocação, os pacientes devem ser informados sobre os riscos de falha mecânica, erosão, infecção e incontinência persistente.
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O National Institute for Health and Care Excellence (NICE) recomenda o implante de EUA para tratar incontinência urinária de esforço para homens que não tenham respondido aos tratamentos conservador e medicamentoso.
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A Haute Autorité de Santé (HAS), Autoridade Nacional Francesa para Saúde recomenda o uso do EUA nos casos de incontinência urinária por mais de nove meses pós-prostatectomia e após falha na reabilitação.
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'''Contraindicações:'''
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- Problemas que afetam a destreza manual ou motivação e que podem impedir que o paciente opere o dispositivo;
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- Pacientes com uma incontinência urinária provocada ou complicada, por obstrução irreversível do trato urinário inferior;
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- Pacientes que apresentem hiperreflexia do detrusor ou instabilidade da bexiga insolúvel;
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- Infecção aguda do trato urinário que pode levar a complicações pós-operatórias;
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-Pacientes que o cirurgião determinar como não adequados devido a riscos associados às intervenções cirúrgicas abertas ou conforme o histórico médico dos pacientes (problemas físicos ou mentais);
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- Hipersensibilidade conhecida à borracha de silicone;
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- Dispositivos com antimicrobianos: contraindicado em pacientes com alergia ou sensibilidade conhecida a rifampicina, minociclina ou outras tetraciclinas; e em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico, pois há relatos de agravamento deste quadro com minociclina.
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'''Eventos adversos:'''
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Os seguintes eventos adversos podem ser relatados: aderências, reações alérgicas, contratura, trombose venosa profunda, deiscência, disúria, edema, erosão do tecido, fibrose, fístula, corpo estranho/fragmento de dispositivo não recuperado, hematoma, hematúria, hemorragia, herniação do dispositivo através do tecido, infecção, coaptação uretral limitada (pode ser decorrente de vazamento, dimensionamento, mau funcionamento e colocação do dispositivo ou de outras causas), mau funcionamento, mau posicionamento de componentes, mau funcionamento mecânico ou dificuldade mecânica, migração de componente, bexiga hiperativa, dor/desconforto, procedimento prolongado, dano cirúrgico involuntário (perfuração ou lesão na bexiga, uretra, nervos, vasos ou outras estruturas locais), atrofia uretral, estenose uretral, retenção urinária e urgência urinária, espasmos da bexiga, cicatrização retardada da ferida, hidrocele e insatisfação do paciente.
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== Implante de Esfincter Urinário Artificial na Saúde Suplementar ==
  
O tratamento da IUE é realizado inicialmente com medidas conservadoras que incluem fisioterapia de reabilitação do assoalho pélvico, medidas comportamentais que incluem treinamento vesical e orientações de ingesta hídrica. Não há tratamento farmacológico eficaz para IUE, restando como opção para aqueles pacientes sem resposta ao manejo inicial e persistente após um ano o tratamento cirúrgico. Dentre os tratamentos cirúrgicos estão incluídos '''slings masculinos e o implante de esfíncter urinário artificial'''.
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O procedimento foi incorporado na '''saúde suplementar por meio da Diretriz de Utilização (DUT) da ANS nº 47 DUT 47''', que define os critérios para a cobertura obrigatória de tratamento cirúrgico para incontinência urinária, incluindo o uso do esfíncter artificial:
  
== O Esfíncter Urinário Artificial ==
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Cobertura obrigatória para pacientes com incontinência urinária grave (confirmada por exame de urodinâmica) após prostatectomia para tratamento de câncer de próstata, quando o paciente preencher todos os critérios do Grupo I e nenhum dos critérios do Grupo II:
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Grupo I
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a. prostatectomia realizada há pelo menos 12 meses;
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b. níveis séricos de PSA <0,01 ng/ml nos últimos 12 meses ou <0,5 ng/ml para os casos em que o paciente foi submetido à radioterapia;
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c. estado nutricional adequado (Albumina ≥3,5 g/dl e IMC > 22kg/m²);
  
O esfíncter urinário artificial (EUA) é um dispositivo composto por um manguito uretral circunferencial, um reservatório de balão regulador de pressão e uma bomba escrotal. O manguito abre após compressão manual da bomba escrotal permitindo que o paciente urine a intervalos programados e fecha automaticamente após um período de dois a três minutos, o que confere a continência urinária. O paciente deve ter capacidade cognitiva e destreza suficientes para operar o dispositivo de forma correta.
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d. possua habilidade motora e cognitiva sendo capaz de realizar as atividades da vida diária;
  
O implante de EUA é considerado pelas Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT) do Adenocarcinoma de Próstata, como padão ouro para incontinência urinária grave masculina persistente (após 12 meses) pós-prostatectomia radical. O EUA é implantado cirurgicamente, em centros especializados, e a experiência do cirurgião é um fator crítico de sucesso do procedimento. Antes da colocação, os pacientes devem ser informados sobre os riscos de falha mecânica, erosão, infecção e incontinência persistente
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e. tenha sido tentado tratamento conservador prévio, sem resultados.
  
A comparação das duas técnicas cirúrgicas (sling masculino e esfíncter artificial) foi alvo de uma revisão sistemática com metanálise publicada em 2017. O desfecho primário foi o uso diário de absorventes antes e após a cirurgia e os desfechos secundários foram qualidade de vida antes e após a cirurgia e frequência de cura (sem necessidade de uso de absorvente por pelo menos 1 dia) e melhora (diminuição do uso de absorvente) na incontinência depois da cirurgia.
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Grupo II
  
Foram incluídos 34 estudos e os resultados mostraram que tanto o sling masculino quanto o esfíncter urinário artificial diminuíram significativamente o número de absorventes usados ​​por dia (P<0,001) e aumentaram a qualidade de vida em comparação com antes da intervenção (P <0,001). Além disso, o índice de cura ficou em 60% (IC95% 51 a 67%, P = 0.022) nos pacientes  submetidos a intervenção com sling e  56% nos pacientes em que foi utilizado o esfíncter artificial (IC95% 44 a 68%, P = 0.342). Foi encontrada uma alta heterogeneidade entre os estudos na maioria das metanálises.
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a. recidiva local da neoplasia;
  
Os autores concluíram que ambas as intervenções são eficazes na redução da incontinência e na melhora da qualidade de vida.
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b. baixa expectativa de vida;
  
Uma segunda revisão sistemática demonstrou resultados semelhantes. Foram incluídos estudos com pacientes com mais de 18 anos de idade com IUE pós prostatectomia submetidos a cirurgia com sling ou intervenção com esfíncter artificial e monitorados por mais de 12 meses. Sete estudos foram incluídos, resultando em um tamanho de amostra de 420 pacientes. O pad test  mostrou resolução da IUE ou melhora em 70% dos pacientes do grupo sling e em 74% dos pacientes do grupo esfíncter artificial. A qualidade de vida foi avaliada pela escala de sintomas incontinence impact questionnaire, short form e mostrou melhora, com uma pontuação de 82,8% no grupo esfíncter artificial em comparação com 86,1% no grupo sling. Ao comparar intervenções com não intervenção, os riscos relativos (RRs) para melhora foram de 35,37 (IC95% 7,17 a 174,35) e 45,14 (IC95% 11,09 a 183,70) respectivamente para sling e esfíncter artificial. Não foram encontradas diferenças significativas quando os dois métodos foram comparados entre si com um RR de 0,78 (IC95% 0,09 a 6,56). A maioria dos estudos foi classificado como baixo risco de viés.
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c. história de alergia ao silicone;
  
Os autores concluíram que ambas as intervenções podem reduzir a incontinência e melhorar a qualidade de vida dos pacientes com IUE pós prostatectomia. Apesar disso, também foi reconhecido que a literatura é limitada, pois não há ensaios clínicos randomizados disponíveis e existe uma heterogeneidade considerável nas variáveis ​​de desfecho medidas.
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d. doenças uretrais crônicas.
  
== Recomendação Inicial da Conitec ==
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== Esfíncter Artificial X Sling Masculino ==
 
A CONITEC avaliou esta questão e em seu relatório a análise da evidência disponível sobre o implante de esfíncter urinário artificial e opções terapêuticas como slings e injeções, para o manejo de incontinência urinária moderada a grave, permitem uma abordagem indireta da efetividade comparativa dessas técnicas. O esfíncter artificial e os slings parecem ser terapias efetivas no manejo de incontinência urinária moderada a grave pós-prostatectomia radical para o tratamento do câncer de próstata. Em pacientes com sintomas moderados, ambas as estratégias parecem ter efetividade similar. Para casos com sintomas graves, o esfíncter artificial parece ter um benefício adicional na melhora dos sintomas e cura.
 
  
O assunto foi novamente discutido e, em agosto de 2025, a CONITEC recomendou, inicialmente, a não incorporação, mas abriu uma Consulta Pública (Nº 74) para receber contribuições da sociedade sobre o tema, que se encerrou em outubro de 2025.
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O sling para incontinência urinária é uma cirurgia minimamente invasiva que coloca uma faixa (sling) de material sintético sob a uretra para dar suporte e impedir a perda involuntária de urina.  
  
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A comparação das duas técnicas cirúrgicas (sling masculino e esfíncter artificial) foi alvo de uma revisão sistemática com metanálise publicada em 2017. O desfecho primário foi o uso diário de absorventes antes e após a cirurgia e os desfechos secundários foram qualidade de vida antes e após a cirurgia e frequência de cura (sem necessidade de uso de absorvente por pelo menos 1 dia) e melhora (diminuição do uso de absorvente) na incontinência depois da cirurgia.
  
Em documento do National Institute for Health and Care Excellence (NICE), do governo britânico, sobre tratamento de sintomas do trato urinário inferior em homens a respeito do manejo da incontinência urinária de esforço sugere que o tratamento cirúrgico com implante de esfíncter urinário artificial seja considerado somente para casos não responsivos ao tratamento conservador e medicamentoso (8).
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Foram incluídos 34 estudos e os resultados mostraram que tanto o sling masculino quanto o esfíncter urinário artificial diminuíram significativamente o número de absorventes usados ​​por dia (P<0,001) e aumentaram a qualidade de vida em comparação com antes da intervenção (P <0,001). Além disso, o índice de cura ficou em 60% (IC95% 51 a 67%, P = 0.022) nos pacientes  submetidos a intervenção com sling e  56% nos pacientes em que foi utilizado o esfíncter artificial (IC95% 44 a 68%, P = 0.342). Foi encontrada uma alta heterogeneidade entre os estudos na maioria das metanálises. Os autores concluíram que ambas as intervenções são eficazes na redução da incontinência e na melhora da qualidade de vida.
  
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Uma segunda revisão sistemática demonstrou resultados semelhantes. Foram incluídos estudos com pacientes com mais de 18 anos de idade com IUE pós prostatectomia submetidos a cirurgia com sling ou intervenção com esfíncter artificial e monitorados por mais de 12 meses. Sete estudos foram incluídos, resultando em um tamanho de amostra de 420 pacientes. O pad test  mostrou resolução da IUE ou melhora em 70% dos pacientes do grupo sling e em 74% dos pacientes do grupo esfíncter artificial. A qualidade de vida foi avaliada pela escala de sintomas incontinence impact questionnaire, short form e mostrou melhora, com uma pontuação de 82,8% no grupo esfíncter artificial em comparação com 86,1% no grupo sling. Ao comparar intervenções com não intervenção, os riscos relativos (RRs) para melhora foram de 35,37 (IC95% 7,17 a 174,35) e 45,14 (IC95% 11,09 a 183,70) respectivamente para sling e esfíncter artificial. Não foram encontradas diferenças significativas quando os dois métodos foram comparados entre si com um RR de 0,78 (IC95% 0,09 a 6,56). A maioria dos estudos foi classificado como baixo risco de viés.
  
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Os autores concluíram que ambas as intervenções podem reduzir a incontinência e melhorar a qualidade de vida dos pacientes com IUE pós prostatectomia. Apesar disso, também foi reconhecido que a literatura é limitada, pois não há ensaios clínicos randomizados disponíveis e existe uma heterogeneidade considerável nas variáveis ​​de desfecho medidas.
  
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== Recomendação Inicial da Conitec ==
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Em 2017, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC) realizou uma avaliação do implante de esfíncter urinário artificial. Naquela ocasião, a Comissão recomendou a não incorporação do procedimento ao Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento de incontinência urinária grave pós-prostatectomia.
  
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O assunto foi novamente discutido e, em agosto de 2025, a CONITEC recomendou, inicialmente, a não incorporação, mas abriu uma Consulta Pública (Nº 74) para receber contribuições da sociedade sobre o tema, que se encerrou em outubro de 2025.
  
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https://www.gov.br/participamaisbrasil/consulta-publica-conitec-sectics-n-74-2025-esfincter-urinario-artificial
  
  

Edição das 12h19min de 11 de dezembro de 2025

Incontinência Urinária

A incontinência urinária é uma complicação tardia conhecida após tratamentos cirúrgicos e radioterápicos de doenças da próstata. Trata-se de uma condição dinâmica e pode apresentar melhora até dois anos após procedimento com terapias conservadoras (por exemplo fisioterapia de reabilitação do assoalho pélvico). Deficiência esfincteriana intrínseca é a causa mais comum de incontinência pós cirurgia prostática. Após prostatectomia radical, por exemplo, 88 a 100% dos homens incontinentes apresentam deficiência esfincteriana intrínseca como a principal causa de sua incontinência. Especificamente, a perda urinária que ocorre com tosse, risada, espirro, caminhada ou outra atividade extenuante é sugestiva de incontinência urinária de esforço (IUE). Uma história de IUE tem um valor preditivo positivo de 95% e valor preditivo negativo de 100% para a presença de IUE em estudos urodinâmicos.

A classificação de gravidade da incontinência pós prostatectomia radical é clínica e a medida mais utilizada é o “pad test” ou teste do absorvente. Esta avaliação consiste na aferição do peso de um absorvente em 1h ou 24h e é considerado o padrão ouro para a quantificação do grau de incontinência. O teste do absorvente de uma hora foi descrito como uma ferramenta de triagem para determinar a presença de incontinência, enquanto o teste do absorvente de 24 horas é mais útil para quantificar o volume de perda urinária. Durante o teste de absorvente de uma hora, o paciente ingere 500 ml de líquido e, em seguida, realiza várias manobras de esforço (caminhar, levantar da posição sentada, correr no lugar, dobrar-se). Um peso de perda superior a 50 gramas no teste de 1h é considerado indicativo de incontinência urinária grave.

Tratamentos da Incontinência Urinária

O Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de Incontinência Urinária, publicado em janeiro de 2020, não aborda procedimentos cirúrgicos para tratamento de incontinência urinária de esforço para homens ou mulheres. Nesse sentido, é recomendado o tratamento conservador, por meio de orientação, exercícios pélvicos e uso de biofeedback. Este consiste em um aparelho que capta informações da musculatura do assoalho pélvico, transformandoas em informações visuais e sonoras para o fisioterapeuta e o paciente. Tais procedimentos devem ser adotados nos 12 primeiros meses, na medida em que antecipam a recuperação espontânea da continência. A modificação de fatores de estilo de vida, a exemplo da dieta, do próprio ato de urinar, bem como do horário e da adequação de ingestão de líquidos, podem melhorar a incontinência urinária de esforço.

Quanto à incontinência urinária pós-prostatectomia, sabe-se que, na maioria dos casos, ela se resolve de maneira espontânea no período de seis a 12 meses após o procedimento. Inclusive, esse tempo de recuperação da continência pode ser diminuído com a adoção de técnicas de reabilitação já nos primeiros meses. A respeito disso, pode ser indicado o Treinamento dos Músculos do Assoalho Pélvico (TMAP), porém, essa técnica não oferece benefícios passados 12 meses da realização da prostatectomia. https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/consultas/relatorios/2025/sociedade/relatorio-para-sociedade-no-573_esfincter-urinario_pos-prostatectomia.pdf

O tratamento da IUE é realizado inicialmente com medidas conservadoras que incluem fisioterapia de reabilitação do assoalho pélvico, medidas comportamentais que incluem treinamento vesical e orientações de ingesta hídrica. Não há tratamento farmacológico eficaz para IUE, restando como opção para aqueles pacientes sem resposta ao manejo inicial e persistente após um ano o tratamento cirúrgico. Dentre os tratamentos cirúrgicos estão incluídos slings masculinos e o implante de esfíncter urinário artificial.

O Esfíncter Urinário Artificial

O esfíncter urinário artificial (EUA) é um dispositivo composto por um manguito uretral circunferencial, um reservatório de balão regulador de pressão e uma bomba escrotal. O manguito abre após compressão manual da bomba escrotal permitindo que o paciente urine a intervalos programados e fecha automaticamente após um período de dois a três minutos, o que confere a continência urinária. O paciente deve ter capacidade cognitiva e destreza suficientes para operar o dispositivo de forma correta.

O implante de EUA é considerado pelas Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT) do Adenocarcinoma de Próstata, como padão ouro para incontinência urinária grave masculina persistente (após 12 meses) pós-prostatectomia radical. O EUA é implantado cirurgicamente, em centros especializados, e a experiência do cirurgião é um fator crítico de sucesso do procedimento. Antes da colocação, os pacientes devem ser informados sobre os riscos de falha mecânica, erosão, infecção e incontinência persistente.

O National Institute for Health and Care Excellence (NICE) recomenda o implante de EUA para tratar incontinência urinária de esforço para homens que não tenham respondido aos tratamentos conservador e medicamentoso.

A Haute Autorité de Santé (HAS), Autoridade Nacional Francesa para Saúde recomenda o uso do EUA nos casos de incontinência urinária por mais de nove meses pós-prostatectomia e após falha na reabilitação.

Contraindicações:

- Problemas que afetam a destreza manual ou motivação e que podem impedir que o paciente opere o dispositivo;

- Pacientes com uma incontinência urinária provocada ou complicada, por obstrução irreversível do trato urinário inferior;

- Pacientes que apresentem hiperreflexia do detrusor ou instabilidade da bexiga insolúvel;

- Infecção aguda do trato urinário que pode levar a complicações pós-operatórias;

-Pacientes que o cirurgião determinar como não adequados devido a riscos associados às intervenções cirúrgicas abertas ou conforme o histórico médico dos pacientes (problemas físicos ou mentais);

- Hipersensibilidade conhecida à borracha de silicone;

- Dispositivos com antimicrobianos: contraindicado em pacientes com alergia ou sensibilidade conhecida a rifampicina, minociclina ou outras tetraciclinas; e em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico, pois há relatos de agravamento deste quadro com minociclina.

Eventos adversos:

Os seguintes eventos adversos podem ser relatados: aderências, reações alérgicas, contratura, trombose venosa profunda, deiscência, disúria, edema, erosão do tecido, fibrose, fístula, corpo estranho/fragmento de dispositivo não recuperado, hematoma, hematúria, hemorragia, herniação do dispositivo através do tecido, infecção, coaptação uretral limitada (pode ser decorrente de vazamento, dimensionamento, mau funcionamento e colocação do dispositivo ou de outras causas), mau funcionamento, mau posicionamento de componentes, mau funcionamento mecânico ou dificuldade mecânica, migração de componente, bexiga hiperativa, dor/desconforto, procedimento prolongado, dano cirúrgico involuntário (perfuração ou lesão na bexiga, uretra, nervos, vasos ou outras estruturas locais), atrofia uretral, estenose uretral, retenção urinária e urgência urinária, espasmos da bexiga, cicatrização retardada da ferida, hidrocele e insatisfação do paciente.


Implante de Esfincter Urinário Artificial na Saúde Suplementar

O procedimento foi incorporado na saúde suplementar por meio da Diretriz de Utilização (DUT) da ANS nº 47 DUT 47, que define os critérios para a cobertura obrigatória de tratamento cirúrgico para incontinência urinária, incluindo o uso do esfíncter artificial:

Cobertura obrigatória para pacientes com incontinência urinária grave (confirmada por exame de urodinâmica) após prostatectomia para tratamento de câncer de próstata, quando o paciente preencher todos os critérios do Grupo I e nenhum dos critérios do Grupo II:

Grupo I

a. prostatectomia realizada há pelo menos 12 meses;

b. níveis séricos de PSA <0,01 ng/ml nos últimos 12 meses ou <0,5 ng/ml para os casos em que o paciente foi submetido à radioterapia;

c. estado nutricional adequado (Albumina ≥3,5 g/dl e IMC > 22kg/m²);

d. possua habilidade motora e cognitiva sendo capaz de realizar as atividades da vida diária;

e. tenha sido tentado tratamento conservador prévio, sem resultados.

Grupo II

a. recidiva local da neoplasia;

b. baixa expectativa de vida;

c. história de alergia ao silicone;

d. doenças uretrais crônicas.

Esfíncter Artificial X Sling Masculino

O sling para incontinência urinária é uma cirurgia minimamente invasiva que coloca uma faixa (sling) de material sintético sob a uretra para dar suporte e impedir a perda involuntária de urina.

A comparação das duas técnicas cirúrgicas (sling masculino e esfíncter artificial) foi alvo de uma revisão sistemática com metanálise publicada em 2017. O desfecho primário foi o uso diário de absorventes antes e após a cirurgia e os desfechos secundários foram qualidade de vida antes e após a cirurgia e frequência de cura (sem necessidade de uso de absorvente por pelo menos 1 dia) e melhora (diminuição do uso de absorvente) na incontinência depois da cirurgia.

Foram incluídos 34 estudos e os resultados mostraram que tanto o sling masculino quanto o esfíncter urinário artificial diminuíram significativamente o número de absorventes usados ​​por dia (P<0,001) e aumentaram a qualidade de vida em comparação com antes da intervenção (P <0,001). Além disso, o índice de cura ficou em 60% (IC95% 51 a 67%, P = 0.022) nos pacientes  submetidos a intervenção com sling e  56% nos pacientes em que foi utilizado o esfíncter artificial (IC95% 44 a 68%, P = 0.342). Foi encontrada uma alta heterogeneidade entre os estudos na maioria das metanálises. Os autores concluíram que ambas as intervenções são eficazes na redução da incontinência e na melhora da qualidade de vida.

Uma segunda revisão sistemática demonstrou resultados semelhantes. Foram incluídos estudos com pacientes com mais de 18 anos de idade com IUE pós prostatectomia submetidos a cirurgia com sling ou intervenção com esfíncter artificial e monitorados por mais de 12 meses. Sete estudos foram incluídos, resultando em um tamanho de amostra de 420 pacientes. O pad test  mostrou resolução da IUE ou melhora em 70% dos pacientes do grupo sling e em 74% dos pacientes do grupo esfíncter artificial. A qualidade de vida foi avaliada pela escala de sintomas incontinence impact questionnaire, short form e mostrou melhora, com uma pontuação de 82,8% no grupo esfíncter artificial em comparação com 86,1% no grupo sling. Ao comparar intervenções com não intervenção, os riscos relativos (RRs) para melhora foram de 35,37 (IC95% 7,17 a 174,35) e 45,14 (IC95% 11,09 a 183,70) respectivamente para sling e esfíncter artificial. Não foram encontradas diferenças significativas quando os dois métodos foram comparados entre si com um RR de 0,78 (IC95% 0,09 a 6,56). A maioria dos estudos foi classificado como baixo risco de viés.

Os autores concluíram que ambas as intervenções podem reduzir a incontinência e melhorar a qualidade de vida dos pacientes com IUE pós prostatectomia. Apesar disso, também foi reconhecido que a literatura é limitada, pois não há ensaios clínicos randomizados disponíveis e existe uma heterogeneidade considerável nas variáveis ​​de desfecho medidas.

Recomendação Inicial da Conitec

Em 2017, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC) realizou uma avaliação do implante de esfíncter urinário artificial. Naquela ocasião, a Comissão recomendou a não incorporação do procedimento ao Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento de incontinência urinária grave pós-prostatectomia.

O assunto foi novamente discutido e, em agosto de 2025, a CONITEC recomendou, inicialmente, a não incorporação, mas abriu uma Consulta Pública (Nº 74) para receber contribuições da sociedade sobre o tema, que se encerrou em outubro de 2025.

https://www.gov.br/participamaisbrasil/consulta-publica-conitec-sectics-n-74-2025-esfincter-urinario-artificial




Comiter CV, Speed J. Urinary incontinence after prostate treatment. UpToDate. 2022. Disponível em: <https://www.uptodate.com/contents/urinary-incontinence-after-prostate-treatment>. 

https://www.pje.jus.br/e-natjus/notaTecnica-dados.php?idNotaTecnica=265153

https://www.pje.jus.br/e-natjus/notaTecnica-dados.php?output=pdf&token=nt:353300:1763804022:4054b48e4e953febbe7cc73693071094f46af1f884fa2af1a95cef5b30cb2c1b