Mudanças entre as edições de "Dosagem de porfobilinogênio urinário"
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Edição atual tal como às 15h08min de 30 de junho de 2025
Índice
Introdução
As porfirias são distúrbios metabólicos raros hereditários ou adquiridos em que há uma deficiência parcial ou completa em uma das oito enzimas da via de biossíntese do heme, para cada qual corresponde a um tipo específico de porfiria. O heme é utilizado em processos bioquímicos respiratórios e de oxidação-redução, e as deficiências enzimáticas em sua síntese resultam na superprodução de porfirinas, levando ao acúmulo anormal dos precursores, metabólicos intermediários tóxicos, principalmente PBG e ácido delta-aminolevulínico (ALA). A biossíntese do heme é particularmente mais ativa nas células eritropoiéticas (medula óssea), onde é utilizado para a síntese de hemoglobina, e nos hepatócitos (fígado), onde é necessário para a síntese de hemoproteínas e citocromos.
Assim, com base no tecido afetado, as porfirias podem ser classificadas como eritropoiéticas ou hepáticas, respectivamente.
Outra classificação, de acordo com a forma de apresentação dos sintomas, divide as porfirias em hepáticas agudas, com predomínio de sintomas neuropsiquiátricos e viscerais com períodos de latência clínica, e cutâneas, que se têm por fotossensibilidade da pele.
As porfirias eritropoiéticas cutâneas incluem a protoporfiria ligada ao cromossomo X (PLX), a porfiria eritropoiética congênita (PEC) e a protoporfiria eritropoiética (PPE).
As porfirias hepáticas cutâneas incluem a porfiria cutânea tardia (PCT) e a porfiria hepatoeritropoiética (PHE).
Já as porfirias hepáticas agudas (PHA) incluem a porfiria aguda intermitente (PAI), a coproporfiria hereditária (CPH), a porfiria variegada (PV) e a porfiria por deficiência de ácido delta-aminolevulínico desidratase (PALAD).
Por ser uma condição rara, dados nacionais e globais referentes à incidência e prevalência das porfirias são escassos, independentemente do tipo. Um estudo realizado no Brasil e que incluiu dados de 439 pacientes com porfiria registrados na Associação Brasileira de Porfiria (ABRAPO), mostrou que a PAI é o tipo mais frequente no país, representando 59,4% dos casos. CPH, PV e PALAD correspondem a, respectivamente, 4,3%, 2,5% e 0,4%. PAI é também mais comum entre as PHA no mundo, com prevalência estimada em 5 a 10 casos por 100.000 pessoas. PALAD é o tipo mais raro e apresenta apenas, em média, 12 casos relatados na literatura mundial.
De modo geral, a PHA é predominante em mulheres (cerca de 90% dos casos) e os sintomas se manifestam geralmente na puberdade, comumente precipitados por alterações metabólicas e hormonais, durante a fase lútea do ciclo menstrual.
Segundo dados do DATASUS, ocorreram 273 mortes por porfiria no Brasil (CID: E800, E801 e E802), incluindo homens e mulheres, entre os anos de 2000 e 2020.
Cerca de 90% dos pacientes com porfiria podem ser assintomáticos por toda a vida, um desafio diagnóstico da doença. Em um estudo brasileiro que avaliou 148 pacientes com PHA, foi relatada mediana do tempo para o diagnóstico definitivo foi de 9,6 anos.
Sintomatologia e Diagnóstico da PHA
Pacientes com PHA apresentam sintomas neuroviscerais agudos devido ao acúmulo anormal dos precursores de porfirina, ALA e PBG.
Clinicamente, apresentam dor abdominal aguda intensa e recorrente inexplicável, dor associada à fase lútea do ciclo menstrual (predominância de progesterona), urina escura/avermelhada, náuseas, vômitos, constipação, fraqueza muscular proximal, neuropatia, hiponatremia, taquicardia e hipertensão.
Esses sintomas, com sobreposições de manifestações neuroviscerais e sistêmicas, são difíceis de serem diferenciados de outras doenças.
Fatores precipitantes que incitam ataques agudos incluem ingestão de álcool, tabagismo, jejum prolongado, dietas pobres em carboidratos, estresse, exposição solar, ciclo menstrual, gravidez, puerpério, procedimentos cirúrgicos e uma variedade de drogas porfirinogênicas inseguras (por exemplo, contraceptivos hormonais, fenitoína, barbitúricos e sulfonamidas).
Durante os ataques agudos, há o aumento significativo de ALA e PBG na urina. Testes rápidos e qualitativos de PBG são utilizados há muito tempo. Os resultados equivocados ou positivos de qualquer teste de triagem qualitativo devem ser seguidos de determinações quantitativas dos parâmetros, como o PBG, para confirmar a suspeita de anormalidade.
O teste genético é indicado para confirmar o diagnóstico de PHA em pacientes com teste bioquímico positivo e, também, o de subgrupos de PHA em casos de PBG e ALA elevados. A confirmação do tipo específico geralmente é estabelecida com o sequenciamento de 4 genes (ALAD, HMBS, CPOX e PPOX), cada um relacionado a PALAD, PAI, CPH e PV, respectivamente. Embora o teste genético seja o padrão-ouro para confirmação do diagnóstico, não é recomendado para a triagem inicial. Os membros da família de primeiro grau devem ser rastreados por esse teste, porque a constatação da variante familiar em um paciente com PHA pode auxiliar na identificação de casos com risco de ataques agudos. A triagem genética de parentes em risco e o aconselhamento genético são fundamentais para que os pacientes permaneçam assintomáticos.
Evolução e Prognóstico da PHA
Com cuidados de suporte, os pacientes geralmente se recuperam bem de ataques agudos, sendo que, aproximadamente, apenas um porcento (1%) dos ataques são fatais, presumivelmente devido à arritmia cardíaca.
Indivíduos com porfiria, além disso, apresentam um aumento da prevalência de transtornos psiquiátricos, como ansiedade, depressão, alterações comportamentais e transtorno por uso de substâncias.
Tratamento
A precisão e a rapidez no diagnóstico são de suma importância para garantir que o tratamento tenha resultados clínicos benéficos aos pacientes, pois a demora nos cuidados pode acarretar em consequências como lesão neurológica ou morte.
Isso se aplica a crises agudas das porfirias, que requerem tratamento dos sintomas e das complicações, além de terapêutica específica para restabelecer a homeostase do heme.
O manejo inicial inclui geralmente a retirada de todos os medicamentos considerados não seguros, assim como outros possíveis fatores precipitantes.
O tratamento específico envolve hidratação, administração de glicose em altas doses e de medicamentos, de acordo com a escolha do especialista.
Tratamentos paliativos para dor, náusea e alívio de outros sintomas durante um ataque agudo devem ser realizados utilizando apenas medicamentos considerados seguros para pacientes com porfirias.
Como é feito o diagnóstico da porfiria hepática aguda no SUS?
Para o diagnóstico de porfirias o SUS disponibiliza um exame denominado “pesquisa de porfobilinogênio na urina” (pPBGu) - código na tabela SIGTAP 02.02.05.029-7 -, capaz de acusar a presença, na urina, de PBG, substância cuja concentração aumenta durante os ataques agudos da doença. O teste, porém, é de natureza qualitativa, ou seja, apesar de detectar, não consegue estabelecer a quantidade da substância presente na amostra.
Além desse exame, também estão disponíveis no SUS a dosagem (quantificação) de ALA e de porfirinas: 02.02.07.006-9 - DOSAGEM DE ALA-DESIDRATASE e 02.02.01.059-7 - DOSAGEM DE PORFIRINAS
Dosagem de PBG urinário (dPBGu – análise quantitativa)
O exame de dosagem de PBG urinário (dPBGu – análise quantitativa), além de acusar a presença da substância na urina, é capaz de indicar sua concentração, favorecendo o diagnóstico da doença e a escolha do tratamento mais adequado.
Sua incorporação no Sistema Único de Saúde (SUS) para confirmação diagnóstica ou prognóstico de porfirias hepáticas agudas foi demandada pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo EconômicoIndustrial da Saúde do Ministério da Saúde (SECTICS/MS), no contexto da elaboração do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de Porfirias.
Para avaliar a precisão do exame de dPBGu para os objetivos mencionados, foi feita análise de evidências clínicas e econômicas, na perspectiva do SUS.
As evidências disponíveis, apesar de indicarem superioridade da tecnologia em avaliação em termos de precisão do resultado, são escassas, possuem limites em relação a itens como o tamanho das amostras, apresentação das análises e resultados, além de apresentar riscos de vieses, algo que ocorre quando há imprecisões na forma de condução dos estudos que podem distorcer os resultados. Por outro lado, a avaliação quantitativa do PBG já se destaca no âmbito clínico como capaz de oferecer maior precisão no resultado em comparação ao teste qualitativo, que detecta a presença de PBG, mas não consegue indicar a concentração.
Para a avaliação econômica foi realizada uma análise de custo-utilidade, técnica que utiliza uma medida denominada QALY para estimar o quantitativo de anos vividos com qualidade, a fim de comparar o teste quantitativo em avaliação (dPBGu) com o teste qualitativo disponível no SUS (pPBGu). Utilizando horizonte temporal de um ano, foram estimados os valores de R$ 593,69 para dPBGu (quantitativo) e R$ 654,05 para pPBGu (qualitativo). Esse resultado indicou que a tecnologia em avaliação entrega maior benefício por um valor menor do que a que o SUS disponibiliza atualmente, ao permitir a identificação mais precisa de pacientes com PBG urinário elevado, favorecendo a adoção de um tratamento efetivo de forma mais rápida e diminuindo, com isso, custos com hospitalizações, por exemplo. Para calcular o impacto orçamentário foram projetados dois cenários. Um deles usou dados do SUS (demanda aferida), relacionados ao procedimento de pesquisa de PBG disponível. O outro utilizou dados epidemiológicos, ou seja, a frequência de ocorrência da doença na população, estimada a partir de dados disponíveis na literatura científica. Nos dois cenários, considerou-se a continuidade da utilização do método qualitativo durante o ataque agudo de porfiria, por esse fornecer resultados mais rápidos. Os dois cenários apresentaram resultados próximos: em cinco anos, a incorporação da dosagem de PBG urinário no SUS geraria um impacto orçamentário de, aproximadamente, 1,16 milhões de reais, quando calculada a partir de demanda aferida, e R$ 1,12 milhões, no caso da utilização de dados epidemiológicos.
Registro da ANVISA
Há três testes aprovados e registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para uso no diagnóstico de PBG: (i) Kit com microcolunas para análise do ACIDO 5-AMINOLEVULINICO (ALA) PORFOBILINOGENIO (PBG) URINA (registro: 80213250681) da empresa fabricante BIOSYSTEMS S.A. e registrado pela RESSERV COMÉRCIO DE PRODUTOS DIAGNOSTICOS LTDA ME; (ii) ClinRep ® Kit completo para 5- Ácido aminolevulínico e Porfobilinogênio na urina – teste de coluna (registro: 80464810227) da empresa fabricante RECIPE e registrado pela ARGOSLAB DISTRIBUIDORA DE PRODUTOS PARA LABORATÓRIOS LTDA; (iii)ClinRep ® Kit Completo para Porfobilinogênio em Urina – teste de coluna (registro: 80464810225) da empresa fabricante RECIPE e registrado pela ARGOSLAB DISTRIBUIDORA DE PRODUTOS PARA LABORATÓRIOS LTD. Os métodos identificam e quantificam os substratos pelas técnicas acopladas de cromatografia e de espectrofotometria. Ou seja, é necessário o laboratório possuir Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (HPLC) para a utilização dos Kits.
RECOMENDAÇÃO DA CONITEC
Os membros do Comitê de Produtos e Procedimentos, presentes na 127ª Reunião Ordinária da Conitec, realizada no dia 08 de março de 2024, deliberaram, por unanimidade, recomendar a incorporação da dosagem de porfobilinogênio urinário para confirmação diagnóstica ou prognóstico de porfirias hepáticas agudas. Os membros do comitê consideraram que a dosagem do PBG urinário fornece maiores valores de sensibilidade e especificidade em comparação à pesquisa de PBG na urina. Foi assinado o registro de deliberação nº 886/2024.
A PORTARIA SECTICS/MS Nº 17, DE 18 DE ABRIL DE 2024 torna pública a decisão de incorporar, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, do exame para a dosagem de porfobilinogênio urinário para confirmação diagnóstica ou prognóstico de porfirias hepáticas agudas.